Uma Metáfora de Morte e Renascimento

O rapto de Perséfone, a donzela da primavera, e a dor de sua mãe Demeter, a Mãe Terra, dão origem ao mito grego que nos ensina sobre a força da vida em sua constante morte e renascimento. E nos mostra que mesmo quando aparentemente não ha vida, ela vibra e pulsa aguardando o momento exato para se revelar. Assim como acontece com a natureza, nós vivemos períodos de carência e tristeza, de aridez interior, mas, ainda que não percebamos, nossa alma está gestando algo novo. Estamos em constante mutação criativa, em continua morte e ressurreição, enfim evoluindo.

A deusa mãe, enlouquecida pela dor da perda da filha, se revolta e torna o solo ressequido e improdutivo, e sua ira ameaça interromper a continuidade dos ciclos da vida.

A alma humana no entanto é fiel a Luz, e dela retira sua força e manifesta seu poder, por isso, nunca se revolta. A rebeldia, a raiva, a revolta e o desalento se enraízem no ego personalidade.

O mito de Perséfone nos mostra a dificuldade de lidarmos com as perdas e ausências, e como são frágeis a fé e o amor que se baseiam em evidências materiais.

A fé intrínseca, oferece a certeza intuitiva que por sua vez brota da experiencia com o divino e transcendente.

É o tipo de fé que desperta em nós a divina alquimia, a energia que transmuta sofrimento em alegria, desespero em perspectivas e autoconfiança. A fé quando alimentada pela lógica previsível, e pelos fatores externos não resiste ao sofrimento, não conhece a certeza luminosa da intuição, que é a sabedoria sobre-humana, a voz silenciosa do espirito.

O mito nos fala também da Graça, que está além da razão, da explicação, do mérito e também da fé. Reza o mito que diante do sofrimento da deusa, e da penúria dos homens, Zeus resolve intervir junto a Hades, e trazer Perséfone de volta. Porém, temendo perder para sempre sua rainha, Hades oferece a Perséfone um produto do seu reino, uma semente de romã.

Ele sabia que se ela comesse um produto do reino subterrâneo, a ele ficaria pertencendo, e por isso à ele voltaria.

Foi quando , Zeus convenceu Hades a deixar que Perséfone passasse seis meses na superfície e seis meses no mundo subterrâneo. Mesmo longe dos olhos de sua mãe, Deméter, Persefone atua preparando durante a sua ausência, o seu retorno trazendo o reflorescimento da natureza.

E assim, sempre que as lágrimas de dor vertidas pela deusa mãe banham a terra, embora invisíveis, latentes possibilidades da vida ressurgir, e expressar beleza, diversidade e abundância, se ocultam nas profundezas do solo da Terra, assim como do nosso ser profundo.

A volta de Perséfone torna férteis, floridos e exuberantes os campos, e as colheitas se apresentam fartas, e se oferecem generosas. Assim acontece também conosco, quando percebemos que renascemos de nós mesmos. e que a fé independe de religião, pois é a ponte entre o Natural e o Sobrenatural, o medo e a coragem, a sobrevivência e a transcendência.

Nosso coração pode fazer da dor um fertilizante para que novos sonhos, esperanças e alegrias brotem. Esse é o mito grego das estações do ano, assim como dos nossos ciclos internos, dos processos sucessivos internos e externos, de morte e renascimento. Durante os seis meses da presença de Perséfone na superfície, a natureza fica em festa, a fartura, a quentura e o brilho do sol imperam. Durante os seis meses em que ela permanece nas frias sombras do subterrâneo reino de Hades, o mundo se torna cinzento, as flores morrem, as árvores perdem as folhas, o solo fica ressequido. Então, o choro de Deméter, irá irrigar as terras e fertiliza-las garantindo desse modo, a criação de mais uma volta na espiral da vida.

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MARILU MARTINELLI - É colaboradora do Instituto Seva. É Jornalista.Escritora. Professora de Mitologia Universal. Filosofia Oriental e Ética das Religiões. Consultora para Formação de Educadores e Gestores em Valores Humanos. Professora convidada da Unipaz SP e PUC SP. Ministra workshops sobre Desenvolvimento Humano.

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